Sessão Coordenada 02 TRABALHO E LEIS I

RESUMOS EXPANDIDOS DAS SESSÕES COORDENADAS

Dia 26/10/2015 – Segunda-feira

14h às 15h45 – Sessão Coordenada 02
TRABALHO E LEIS I
COORDENADOR: PROF. DR. ALISSON DROPPA (UFFS)

A contribuição do médico gaúcho Carlos Penafiel no debate e elaboração das Leis de Acidentes de Trabalho (1918 -1934)
Evangelia Aravanis (Doutora em História - ULBRA)
Palavras-chave: leis de acidentes de trabalho - medicina social - 1a. República
Resumo expandido:
Nesta exposição temos por objetivo apresentar e analisar as contribuições do médico gaúcho Carlos Penafiel para a elaboração das leis de acidentes de trabalho, no Brasil, na Primeira República. Nascido em Porto Alegre, em 1883, concluiu seus estudos na Faculdade de Medicina do RJ. Em Porto Alegre, foi professor da Faculdade de Medicina e o primeiro diretor psiquiátrico do Hospital São Pedro. Na vida política teve também ativa presença, sendo deputado, por duas vezes, pelo Partido Republicano Rio-grandense. Primeiramente à Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul, de 1915 a 1920, e, após, na Câmara Federal, de 1921 a 1923. Foi dentro desta sua atuação política que Penafiel participou, representando o estado do Rio Grande do Sul, na Comissão Especial de Legislação Social, no Congresso Nacional, espaço de discussão e elaboração do projeto de lei da 1a. Lei de Acidentes de Trabalho do Brasil (1919). Penafiel, contudo, não veio a concordar, na íntegra, com o projeto de lei que saiu vencedor desta comissão, elaborando um outro documento, como projeto alternativo ao vencedor. Nossa apresentação centra a análise neste documento de Carlos Penafiel, intitulado "Higiene e Segurança do Trabalo", e onde ele propõe significativas mudanças na legislação do infortúnio, proposições estas que serão contempladas somente a partir das duas próximas leis de acidente de trabalho do Brasil, as de 1934 e de 1944.

Regulamentando o ócio e o lazer operário: um estudo comparativo entre as férias no Brasil e em outros membros da OIT entre 1920 e 1930
Guilherme Machado Nunes (Mestrando em História – UFRGS)
Palavras-chave: Lei de Férias - movimento operário - lazer
Resumo expandido:
O pós-Primeira Guerra foi um período de grande debate sobre a condição de vida da classe trabalhadora. O Bureau International du Ttravail, instituição surgida do Tratado de Versalhes, em 1919, se constituiu em um grande espaço de discussão sobre esse tema cada vez mais latente. A entidade se reunia uma vez por ano com presença de patrões e empregados e discutia temas específicos a cada encontro, como a jornada de trabalho, o trabalho de mulheres e crianças e acidentes de trabalho. Naquele momento, a Revolução Russa de 1917 aparecia como um horizonte possível para a classe trabalhadora, e discutir melhores condições de vida e trabalho era uma tentativa dos governos dos países ocidentais de oferecer uma resposta dentro do capitalismo à alternativa bolchevique, buscando, para tanto, evitar situações de miséria laboral similares às da Rússia czarista. No Brasil, também em função de uma série de greves e mobilizações operárias entre os anos 1917 e 1919, esse é o período em que surgem a Lei de Acidentes de Trabalho (1919), uma controversa Lei de Férias (1925) e o Código de Menores (1927), além do Conselho Nacional do Trabalho (1923), responsável por regulamentar e fiscalizar essas e outras leis. A Lei de Férias foi uma das medidas que mais causou conflitos entre o operariado e a burguesia industrial brasileira. Enquanto estes tentaram de todas as formas dissuadir o Estado de regulamentar o repouso remunerado de seus funcionários, aqueles denunciaram diversas vezes o descumprimento da legislação pelos seus patrões. A dissertação que desenvolvo nesse momento tenta responder de que maneira se deram as disputas entre Estado, burguesia industrial e movimento operário em torno da Lei de Férias. O que se pretende nessa apresentação específica é compreender o contexto global no qual essa lei foi aprovada, compará-la com as férias remuneradas de outras localidades e especular sobre alguns motivos que podem ter levado o governo brasileiro a promulgar essa lei, que sequer compunha as pautas de reivindicações do movimento operário brasileiro até então. Essa medida, aprovada em 1925 e regulamentada em 1926, seria revogada em 1930 e depois aprovada com novo texto em 1934. 
Para tanto, será feita uma exposição comparando o Brasil com outros países que regulamentaram as férias, destacando semelhanças e diferenças. Desde 1905, por exemplo, muitos segmentos operários da Alemanha, Áustria-Hungria, Noruega e Dinamarca gozavam do benefício. Entre 1919 e 1925, países como Finlândia, Itália, Tchecoslováquia e Polônia concederem férias a operários fabris, mineiros, jornalistas e até serviçais. Entre 1926 e 1934, Luxemburgo, Grécia, Romênia, Chile, México, Espanha, Suécia, Peru e Portugal – além do próprio Brasil – também legislaram sobre a matéria. Em 1936, foi a vez de França, Iraque, Bélgica e Bulgária. Em diversas oportunidades os industriais brasileiros disseram que as férias eram estranhas à realidade de um país como o nosso, de industrialização tardia, mas ao olharmos para o exterior, os países de industrialização tardia são justamente a maioria a conceder esse benefício. A OIT, já em 1919, recomendava que se desse algum tempo de “repouso absoluto” aos trabalhadores, algo que seria “fundamental para manter sua sanidade psíquica e moral”. A matéria era de aparente fácil legislação, e talvez isso explique a grande adesão de países majoritariamente periféricos a tal direito entre 1919 e 1936. O caso da Argentina é curioso: percebendo o apelo que a medida tinha entre a classe trabalhadora, Perón encampou as férias em um projeto político, o turismo obrero, que conforme foi possível averiguar, foi uma experiência pioneira. A partir dos anos 1940, o turismo foi grande fonte de propaganda do peronismo e do turismo interno no país. O ócio e o lazer o proletário surgiam como uma questão importante e estavam em disputa ao redor do mundo, e isso foi logo percebido pelo movimento operário organizado. Crescia, dessa forma, a importância de eventos coletivos fora das fábricas, como piqueniques e festas proletárias, e as organizações comunistas e anarquistas tentavam se aproveitar dessas oportunidades para recrutar novos membros. Há ao menos um caso em Porto Alegre em que sabidamente o ócio e as atividades fora da fábrica (no caso, o futebol) foram fundamentais para o recrutamento de um militante, o do metalúrgico Eloy Martins, em 1928, que jogava no time da fábrica Alcaraz quando foi recrutado pelo Bloco Operário e Camponês. Desde cedo os comunistas perceberam não só a importância dos espaços de convivência fora da fábrica como também o valor e o apelo que as férias tinham entre os trabalhadores, fazendo dos cumprimento da Lei de Férias (e outras leis sociais) uma de suas palavras de ordem em diversos momentos, exercendo, assim, crescente influência no meio sindical. Dessa forma, a partir de casos brasileiros e internacionais, sobretudo através da imprensa operária, se discutirá a importância das férias para o operariado, os limites e as possibilidades dessa legislação e como o empresariado nacional via essa questão no Brasil e também em outros países.

Direitos da Mulher: Estado Novo no Rio Grande do Sul (1937-1945)
Glaucia Vieira Ramos Konrad (Doutora em História – UFSM)
Palavras-chave: direitos - mulheres - Estado Novo no Rio Grande do Sul
Resumo expandido:
Durante o Estado Novo (1937-1945), no Rio Grande do Sul, a atualização da legislação trabalhista e social procurava resolver o conflito entre capital e trabalho pela harmonia social, criando um aparato jurídico-corporativo que submetia a vida sindical ao Ministério do Trabalho e a Inspetoria Regional do Trabalho. Porém, antes de ser uma doação do Estado, a conquista dos direitos resultou da resistência e da luta dos trabalhadores pela garantia das mínimas condições de vida e trabalho, especialmente da mulher trabalhadora. Neste período, argumentamos que não existiu um hiato na história de lutas das trabalhadoras, estabelecendo que as relações entre os sindicatos e o Estado, entre as não-sindicalizadas e a sociedade, apresentaram momentos de menor ou maior reação, porém, nunca de conformismo. Através de pesquisa sobre fontes trabalhistas e outras, especialmente de Santa Maria – RS, o objetivo da comunicação é mostrar as formas de como as trabalhadoras rio-grandenses leram o discurso do Estado Novo em relação à sua classe e como reagiram em defesa de seus direitos e nas especificidades de suas lutas em sua formação histórica. Desta forma, será apresentada parte da ação das trabalhadoras para garantir na prática o que estava na letra da lei, como salário mínimo, férias, indenização, aposentadoria, regulamentação do trabalho da mulher, dos domésticos, abono família, educação, saúde, moradia, transporte, etc. Assim, este estudo procura ressaltar e valorizar a complexidade dos processos trabalhistas no interior das reflexões atuais sobre a História Social do Trabalho, visando entender tanto os aspectos técnicos quanto os processos de trabalho. Juntamente com este processo, torna-se fundamental buscar os sujeitos históricos e suas práticas coletivas e institucionais. Perceber nos locais de trabalho, nas relações sociais construídas no fazer da classe operária, nas relações de gênero, nas diversas formas de sociabilidade e lazer, a autonomia das trabalhadoras, mesmo que de forma fragmentada ou mesmo dispersa, traz a possibilidade de construir e dar voz as trabalhadoras de Santa Maria. Também, possibilita perceber as peculiaridades locais, da formação sócio, política, econômica e cultural de Santa Maria, no trato das relações de trabalho com as relações de gênero. Assim, como alerta Ferreira (1997, p. 16), é preciso compreender as mulheres trabalhadoras durante o Estado Novo como sujeitos, nem mais nem menos importantes, mas conscientes de suas ações, ao se apropriarem do discurso do Estado em defesas de seus interesses ou de reagirem a ele. É importante também destacar a reflexão de Emília Viotti da Costa (2001, p. 42) quando diz que “a maioria dos historiadores do trabalho industrial na América Latina continua ignorando o importante papel desempenhado pelas mulheres” e quando o fazem, “limitam-se a oferecer breves comentários sobre sua passividade sem procurar explicá-la”. Assim, conclui a autora que nenhuma história das classes trabalhadoras poderá ser escrita sem que se incorpore a mulher, não apenas as trabalhadoras no setor industrial, mas também as esposas e membros da família que trabalham em outras atividades. Frente ao desafio proposto por Costa esta pesquisa buscará colaborar com a história da mulher no mundo do trabalho. Desta forma, o acervo da Justiça do Trabalho de Santa Maria trata de memórias registradas, constituindo-se de fontes de pesquisa, e através delas é possível identificar e entender as formas de ação, reivindicações e lutas sociais utilizadas pelas trabalhadoras de Santa Maria para garantir os seusdireitos trabalhistas durante o período do Estado Novo. 
Referências Bibliográficas:
COSTA, Emília Viotti da. Experiência versus estruturas: novas tendências na história do trabalho e da classe trabalhadora na América Latina – o que ganhamos? o que perdemos?. In. História Unisinos. Número Especial: V Encontro Estadual de História. São Leopoldo: Unisinos, 2001.
FERREIRA, Jorge. Trabalhadores do Brasil: o imaginário popular (1930-1945). Rio de Janeiro: FGV, 1997.

Demissão como ato de patriotismo: o caso dos trabalhadores súditos do Eixo
Tamires Xavier Soares (Mestranda em História – PUCRS)
Palavras-chave: súditos do Eixo - demissão - patriotismos
Resumo expandido:
O presente trabalho irá analisar um processo trabalhista, ajuizado em 1942 na Justiça do Trabalho de Pelotas, por imigrantes súditos do Eixo contra a empresa norte-americana The Riograndense Light and Power. Os funcionários haviam adquirido estabilidade laboral, ou seja, conforme previsto pela Lei 62 de 1935, o empregado que trabalhasse por dez ou mais anos só poderia ser demitido por motivo de força maior ou falta grave, depois destas serem apuradas por meio de um inquérito administrativo. No entanto, a empresa norte-americana após o ataque a Peral Harbor demitiu, de forma abrupta, todos os nove funcionários súditos do Eixo (oito alemães e um italiano) sem abertura do inquérito administrativo previsto pela Lei 35. Deste modo os funcionários recorreram à Justiça do Trabalho, requerendo suas reintegrações. Em defesa da reclamada, o advogado Bruno de Mendonça Lima afirmava que as despedidas se enquadravam na legislação, pois se tratava de força maior, devido à nacionalidade dos reclamantes, tendo em vista que o Brasil estava neutro, mas havia declarado solidariedade aos Estados Unidos. Havendo o Governo Brasileiro, interpretado o sentir geral da opinião pública do Brasil e honrando os compromissos internacionais antes assumidos, declarando a sua solidariedade aos Estados Unidos, não era possível à Suplicante manter em exercícios empregados que pertenciam a nações agressoras da América (Processo 213-B, 1942, p. 20, grifo meu).
Sendo assim, não haveria, segundo a reclamada, mais condições de manter funcionários de tais nacionalidades trabalhando em uma empresa que prestava serviço público. Além disso, segundo Bruno de Mendonça Lima, o decreto lei 62 de 5 de dezembro de 1935, que previa demissões por motivo de força maior não deixava especificado o que significava motivos de força maior. Entendendo que os funcionários eram súditos do eixo e representavam perigo para a segurança pública, a empresa os demitiu acreditado que as demissões se adequariam à legislação, como motivo de força maior. Os reclamantes alegam que foram demitidos em dezembro de 1941, ou seja, antes do Brasil romper sua política de neutralidade e aproximar-se dor aliados. Logo, não configurava força maior, e mesmo se fosse o caso haveria necessidade da previa abertura de um inquérito administrativo. Entretanto a reclamada argumentou que as demissões: “foram medidas de prudência e de patriotismo.”. E caso a decisão da Junta de Conciliação e Julgamento de Pelotas decidisse por ordenar a readmissão de tais elementos isso significaria “dar-lhes assim oportunidade para trabalharem contra os interesses da Pátria” (Processo 213-B, 1942, p. 22, grifo meu). Concluindo o julgamento, o Juiz de Direito José Alcina Lemos julgou improcedente a reclamação. Os funcionário inconformados com a decisão da JCJ, recorreram da decisão, encaminhando a reclamação para o Conselho Regional do Trabalho da 4ª Região. 
No recurso, os advogados dos reclamantes formulam a defesa dos funcionários. Começam argumentando que os imigrantes eram homens íntegros e possuíam famílias brasileiras. “Em primeiro lugar, os reclamantes estão no Brasil há mais de dez anos uns, e outros há mais de quarenta, cooperando por seu engrandecimento, e em segundo lugar, são todos casados com mulheres brasileiras e tem filhos brasileiros, e alguns até netos, e jamais cometeram qualquer ato que os desabonassem”. (Processo 213-B, 1942, p. 32). Por fim, os reclamantes utilizam o próprio discurso oficial contra a sentença proferida pela JCJ de Pelotas: M.S. Ministério do Trabalho, que por diversas vezes veio a público em nome do Governo, afirmar o seu ponto de vista em não modificar a atual Legislação Trabalhista, de vez que a mesma satisfaz plenamente e garante não só a tranquilidade do Brasil como o direito dos estrangeiros, mas se assim não procedêssemos, não estaríamos pugnando pelos direitos dos nossos constituintes, e eis porque não nos podemos furtar. (PROCESSO 213-B, 1942, p. 34). A reclamada não apresentou nenhum argumento novo, apenas reafirma que as demissões foram demonstração de patriotismo e que estavam baseadas na Lei 62 de 1935, pois tratava-se de força maior. No dia 19 de dezembro de 1942 , o Egrégio Tribunal Regional informou sua decisão, declarando procedente o recurso dos trabalhadores Sendo assim a empresa The Riograndense Light and Power teria de reintegrar os funcionários em suas antigas funções, e lhes pagar os salários atrasados pelo tempo em que permaneceram afastados da empresa. Concluindo, a partir da análise deste processo, podemos perceber algumas tensões trabalhistas criadas a partir da guerra, visto que a empresa era norte-americana e no dia 7 de dezembro de 1941, ou seja, onze dias antes das demissões, houve o ataque japonês a Pearl Harbor. Desta forma, acreditamos que as demissões tenham mais ligação com o ataque a base americana, do que com possíveis atos de sabotagem que os trabalhadores poderiam cometer.