Sessão Coordenada 12 FONTES, ACERVOS E HISTORIOGRAFIA

RESUMOS EXPANDIDOS DAS SESSÕES COORDENADAS

Dia 28/10/2015 – Quarta-feira

15h30 às 17h15 – Sessão Coordenada 12
FONTES, ACERVOS E HISTORIOGRAFIA
COORDENADOR: HISTORIADORA CLARISSA SOMMER (APERS)

A recente história dos trabalhadores no Rio Grande do Sul: produções, arquivos e debates (2005-2014)
Clarice Gontarski Speranza (Pós-Doutoranda em História – UFPel) e Micaele Irene Scheer (Doutoranda em História - UFRGS)
Palavras-chave: Historiografia - História do trabalho - pesquisa histórica.
Resumo expandido:
A produção em história do trabalho no Rio Grande do Sul apresentou grande crescimento nos últimos 10 anos, na esteira da ampliação dos cursos de pós-graduação na área e também em face da própria organização dos pesquisadores – na qual figuram, em especial, as atividades do GT Mundos do Trabalho da ANPUH seção RS. Em um levantamento preliminar, foram identificadas 81 dissertações ou teses versando sobre temas relacionados ao universo do trabalho ou do trabalhador defendidas por cinco programas de pós-graduação em História existentes no estado (UFRGS, PUCRS, Unisinos, UFSM e UFPel) entre 2005 e 2014. O objetivo dessa comunicação é expor resultados preliminares deste levantamento sobre as produções acadêmicas relacionadas à história do trabalho no Rio Grande do Sul no âmbito dos programas de pós-graduação. Além de um breve levantamento quantitativo, serão discutidos os temas e períodos mais recorrentes da produção recente, bem como ressaltados os principais debates em andamento. O levantamento também pretende elencar, ao lado dos estudos mais frequentes, temas importantes que não recebem a atenção dos pesquisadores do trabalho no Rio Grande do Sul, e destacar o contexto no qual tais produções surgiram, com a ampliação do número e da diversidade de arquivos sobre o trabalho na região e a atividade do GT enquanto coletivo de pesquisadores. De fato, as novas produções em história do trabalho surgem num contexto de ampliação de arquivos sobre o tema do trabalho disponíveis aos pesquisadores, tanto em Porto Alegre quanto no interior do estado. Uma das iniciativas mais importantes é a disponibilização de fontes do Judiciário trabalhista, tanto junto ao Memorial do Trabalho no Rio Grande do Sul (órgão do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região) quanto em centros de pesquisa ligados a universidades, como o Núcleo de Documentação Histórica da UFPel (que abriga todos as ações trabalhistas que tramitaram nas varas de Pelotas desde sua fundação). Os processos judiciais trabalhistas têm se constituído em exemplo de um movimento de alargamento e diversificação de fontes, que incluem também documentação de empresas e arquivos relacionados a movimentos sindicais e de categorias específicas de trabalhadores, muitos deles disponibilizados digitalmente. Os eventos e reuniões promovidos pelo GT Mundos do Trabalho no Rio Grande do Sul (nos anos inversos às jornadas nacionais e seminários internacionais, realizados bienalmente) podem ser qualificados como fatores determinantes na atração de novos pesquisadores e de aperfeiçoamento dos mais experientes, com base no fomento de debates acadêmicos. Talvez por este fator, observa-se uma diversificação dos temas abordados nas produções. Se em 2001, Loner advertia que a maior parte da produção historiográfica da época sobre trabalhadores gaúchos concentrava-se nos anos da Primeira República até a década de 30 (LONER, 2001, p. 54), o recorte cronológico ampliou-se bastante nos últimos anos, abarcando em especial o período pós-1940, no qual o interesse volta-se a objetos variados – desde movimentos grevistas até a utilização do arcabouço legal varguista como forma de garantir direitos, bem como a relação do movimento sindical com partidos políticos. Da mesma forma, o trabalho escravo (visto isoladamente ou em conjunto com o trabalho livre) tornou-se referência obrigatória aos estudos do mundo do trabalho, ampliando-se o diálogo e as trocas com as pesquisas centradas na escravidão, perspectiva que vai ao encontro dos anseios de Lara, em artigo publicado em 1998, quando afirmou que a maior parte dos autores da área se debruça sobre o trabalho livre assalariado, adotando a “teoria da substituição” do escravo pelo imigrante. Batalha (2006), assim como Lara, observou com pessimismo a situação dos estudos sobre história do trabalho nos anos de 1990, postura que se altera em texto publicado em 2006. Para Batalha, ocorreu uma ampliação de temas e uma abertura de abordagens e enfoques. Classe social, trabalho assalariado e urbano são perspectivas que não reinam mais absolutos, e estão sendo articuladas com: identidades, trabalho não livre, trabalho autônomo, meio rural, etc. As reflexões desse autor são pertinentes para este estudo, tais aspectos serão observados durante a análise das produções acadêmicas no Rio Grande do Sul, entre 2005 e 2014. Em termos metodológicos, destaca-se, além dos cuidados específicos para tipos determinados de fonte, a ampla utilização da história oral, tendência que já se avizinhava no início dos anos 2000, mas que se tornou mais marcante nos estudos recentes, alimentada ainda mais pela ampliação do recorte cronológico e com a aproximação a durações mais próximas do presente. O objetivo é articular a pesquisa sobre a produção em história do trabalho no Rio Grande do Sul com autores que se preocuparam em analisar a história do trabalho no Brasil e nesse estado, com diferentes recortes cronológicos de analise, para observar os avanços (ou não) desses estudos.
Referências:
BATALHA, Claudio H. de M. Os desafios atuais da história do trabalho. Anos 90, Porto Alegre, v. 13, n° 23/24, 2006, p. 87-104.
LARA, Sílvia. Escravidão, cidadania e história do trabalho no Brasil. Projeto História, São Paulo, v. 16, 1998, p. 25-38.
LONER, Beatriz. A história operária no Rio Grande do Sul. História-Unisinos, São Leopoldo, edição especial, 2001, p. 53-79.
MATTOS, Marcelo Badaró. Perspectivas e dilemas da produção historiográfica recente sobre trabalhadores, sindicatos e estado no Brasil. Tempos históricos, Marechal Cândido Rondon, v. 05/06, 2003/2004, p. 11-34.
PETERSEN, Silvia R. F. A presença da história social do trabalho no ambiente acadêmico nas últimas décadas. Mesa redonda. Anais Eletrônicos do XXVI Simpósio Nacional da ANPUH. São Paulo, USP, 2011.

Fontes para a História do Trabalho na região sul do Brasil
Lorena Almeida Gill (Pós-Doutora - UFPel)
Palavras-chave: Núcleo de Documentação Histórica - Arquivo da Justiça do Trabalho - Acervo da Laneira
Resumo expandido:
Faz alguns anos que o Núcleo de Documentação Histórica (NDH) da UFPel constituiu projeto de pesquisa que versa sobre ofícios antigos ou em vias se extinção na região sul do Rio Grande do Sul, visando compreender como os trabalhadores se colocam em um mundo globalizado, o qual tende a fazer com que seus ofícios desapareçam ou se transformem. Tal estudo tem trazido a possibilidade de se pensar e ampliar as fontes de pesquisa para a História do Trabalho. O projeto trabalha basicamente com duas metodologias: história oral temática e pesquisa documental. A história oral temática busca, prioritariamente, construir narrativas sobre um assunto em especial, neste caso as experiências no mundo do trabalho. Já foram entrevistadas 60 pessoas, que possuem diferentes ofícios. A partir destas narrativas e da análise de outros documentos foram feitos trabalhos de conclusão de curso (Licenciatura e Bacharelado em História) versando sobre os estivadores, sapateiros, alfaiates, tecelãs, motorneiros, benzedores, parteiras e também foi publicado livro, organizado por Gill e Scheer, em 2015, que foi intitulado “À Beira da Extinção: memórias de trabalhadores cujos ofícios estão em vias de desaparecer”. Já a parte vinculada à pesquisa documental, se esforça em higienizar, organizar, disponibilizar e analisar um farto material, constituído por mais de 100 mil processos trabalhistas, os quais abarcam o período temporal de 1941 e 1995. Tal acervo foi doado ao NDH, em regime de comodato, no ano de 2006, tendo se iniciado o trabalho no ano de 2009, pois, em um primeiro momento, houve a necessidade de se organizar toda uma infraestrutura que comportasse, de forma adequada, este grande volume de papel. Somente no ano de 2015 foi possível se iniciar o armazenamento das informações presentes nos processos trabalhistas em um Banco de Dados, feito especialmente para as características existentes neste tipo de material. Não há estimativa para a finalização do trabalho, tendo em vista o volume documental existente. Atualmente 7 bolsistas de iniciação científica, de extensão e do Programa de Educação Tutorial estão envolvidas com o trabalho, mas seriam necessários muitos outros para que se avançasse na tarefa, buscando estabelecer algumas séries por data, por exemplo. No Banco de Dados constam os seguintes itens: Nome; Sobrenome; Endereço; Idade; Número da carteira de trabalho; Sexo; Estado civil; Profissão; Benefício; Grau de Instrução. Logo, o cadastro seguinte é a partir da opção “Processos”. Neste digitam-se nos seguintes campos: Número do processo; Número da caixa; Datas de início e conclusão; Demanda; Tipo de ação; Nome do Juiz; Primeira Vara ou Segunda Vara; Arquivado ou não; Sentença justificativa; Tipos de demandantes; Conclusão; Requerentes; Requeridos; Advogados. Na opção “Cadastros Básicos”, o usuário pode editar as opções correspondentes a: Conclusão; Estado civil; Profissões; Tipos de ação; Tipo de demandantes. E, por último, a opção “Pesquisa”, que é utilizada visando realizar buscas. Cerca de 10 anos de processos foram lidos e resumidos e agora estão sendo colocados no Banco de Dados. Nesta compilação alguns dados preliminares aparecem: 85% dos casos se relacionam aos homens e apenas 15% às mulheres. Quando se pensa sobre as demandas das mulheres, a maioria delas era arquivada ou julgada improcedente, já no caso dos homens, na maioria das vezes, era feito acordo. Após a implementação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), as demandas aumentaram consideravelmente. A maioria dos processos teve por requerente os trabalhadores, sendo estes geralmente operários de diversas fábricas da cidade. Muitas vezes não foi mencionada sua função ou setor de trabalho, até porque as atividades desenvolvidas nem sempre foram as efetivamente realizadas. Dentre os operários que demandavam, a maioria tinha postos menos remunerados, mas há alguns casos de chefes e subchefes. Grande parte dos operários era brasileira, mas há situações de estrangeiros, especialmente alemães, italianos e portugueses, algumas das imigrações preponderantes em Pelotas. Nas poucas ocorrências em que a empresa demandava era para demitir algum operário, por justa causa. São poucos os processos plúrimos. Muitas vezes o trabalhador comparecia sozinho na primeira audiência e, no meio dos autos, declarava quem era o seu procurador. A maioria dos processos era resolvida em primeira instância.  As demandas mais frequentes por parte dos trabalhadores eram: pedidos de indenização por demissão sem justa causa; pagamento de aviso prévio e reintegração. Muitos eram solicitados na mesma reclamatória.  Um outro acervo importante e que só recentemente começou a ser organizado é o da Laneira Brasileira Sociedade Anônima Indústria e Comércio, fundada no ano de 1945, em Porto Alegre e transferida para Pelotas, entre os anos de 1948 e 1949. Tratou-se de importante fábrica, que foi referência no comércio lanífero não só da cidade, como do Estado do Rio Grande do Sul. Até o final de 1970 a fábrica se desenvolveu adequadamente, sendo que a lã era vendida para várias regiões do Brasil, do continente americano e europeu, mas a partir dos anos de 1990, começou a diminuir suas atividades, entrando em processo falimentar nos anos de 2000. Esta documentação passou a fazer parte do NDH, a partir de 2010, quando a Universidade Federal de Pelotas recebeu o prédio, para fins acadêmicos. Naquele momento, foram encontrados diversos materiais, que foram praticamente divididos, tendo em vista as temáticas de interesse, entre o Núcleo e a Fototeca Memória da UFPel, coordenada pela professora Francisca Michelon. Atualmente é feita a higienização e organização dos documentos. Foram localizadas fichas pessoais de trabalhadores da empresa, na qual eram anexados o contrato de admissão, recibo de pagamento de salários, atestados médicos, aviso de férias, pagamento de seguro saúde, caderneta de vacinação, dentre outras. Há também uma farta documentação de caráter financeiro, além de recortes de jornais os mais diversos, evidenciando algum fato ocorrido em determinada época e processos judiciais de trabalhadores, especialmente aqueles que envolviam algum acidente de trabalho. Além desse tipo de material, existem diversas plantas arquitetônicas do interior da fábrica, que possuía 10.000 metros de área construída, com os seguintes espaços, que foram se constituindo com o passar dos anos: classificação de lã, cardagem e preparo dos fios, filatório, madeiras e conicaleiras, tingimento, depósito de materiais, caldeiras, lavagem, depósito para produtos acabados, depósitos de lã, escritório. Constam também na documentação uma escritura de alteração de contrato social de 1948 (troca de nome social da Laneira) e uma escritura de venda de um galpão na Avenida Vinte de Setembro.

Os trabalhadores rurais no acervo da Delegacia Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul (1933-1943)
Aristeu Elisandro Machado Lopes (Doutor em História - UFPel)
Palavras-chave: trabalhadores rurais - Delegacia Regional do Trabalho - Carteira Profissional
Resumo expandido:
O Núcleo de Documentação Histórica da Universidade Federal de Pelotas possui, entre seus acervos, os documentos da Inspetoria Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul, a qual foi estabelecida pelo Departamento Nacional do Trabalho em 1932 e em 1940 transformada em Delegacia Regional do Trabalho. A DRT era o órgão responsável por emitir a carteira profissional destinada às garantias dos direitos dos trabalhadores. O estabelecimento da carteira foi parte inicial e importante da legislação social para o trabalhador brasileiro, a qual seria confirmada mais tarde com a Consolidação das Leis do Trabalho. A carteira, assim, foi uma “criação do pós-30 e documento por excelência do novo regime, traduzia o tipo de relação entre cidadão e estado que se desejava construir”. (GOMES, 1988: 242). Antes da emissão o trabalhador declarava várias informações pessoais e profissionais, as quais eram anotadas na ficha de qualificação profissional ou também chamada ficha espelho. Os dados declarados pelo trabalhador permitem identificar a sua cor e seus dados antropométricos, ano de nascimento, grau de instrução, sua profissão e o nome do estabelecimento no qual trabalhava, os nomes dos pais, a cidade de nascimento, informações sobre dependentes, sua filiação sindical, o ano em que solicitou a carteira, entre outros dados relevantes, naquele momento, para a confecção da carteira profissional (LOPES; JAQUES, 2015). O acervo é constituído por essas fichas num total de 627.213 encadernadas ou, então, soltas. A documentação corresponde aos anos entre 1933 e 1968 e estão distribuídas em 1.053 caixas de arquivo permanente. Em relação as possibilidades de consulta, ressalta-se que os projetos de pesquisa desenvolvidos com o acervo já possibilitaram a digitação das informações das fichas em um banco de dados. Esse banco permite múltiplos cruzamentos dos dados facilitando a pesquisa e possibilitando traçar o perfil do trabalhador com carteira nos primeiros anos do governo getulista no Rio Grande do Sul. Atualmente, já estão digitadas no banco as informações de todas as fichas entre os anos de 1933 e 1943 e atualmente está em processo de digitação os dados de 1944. O Total das informações digitadas já representam dados de 44 mil fichas. O objetivo pretendido nesta comunicação se refere a apresentação de uma das possibilidades de pesquisa proporcionadas pelas fichas e com o cruzamento das informações no banco de dados. Como ressaltado, cruzar as informações das fichas já digitadas permite compreender o perfil dos trabalhadores do Rio Grande do Sul a partir de um universo variado de possibilidades, seja através de uma determinada profissão, seja através da análise do grau de instrução, por exemplo. Assim, objetiva-se averiguar a presença de informações sobre os trabalhadores rurais que solicitaram carteira profissional logo após a criação do novo documento. A maioria das informações sobre as profissões dos trabalhadores revela que estavam ligados a ocupações urbanas, como o trabalho em fábricas, construção civil, estabelecimentos comerciais, frigoríficos e, uma parte considerável, de trabalhadores manuais como sapateiros, barbeiros, domésticas, pedreiros, cozinheiros, entre muitos outros. A metodologia empregada na pesquisa, contudo, identificou uma parcela de trabalhadores relacionados às atividades rurais: 134 trabalhadores que declararam sua profissão com agricultores. Alguns apontavam o local de trabalho, como chácaras, indústria de adubos, produção de leite e lavoura de arroz; outros declaravam-se como trabalhadores eventuais ou, ainda, como desempregados.
A comunicação pretende apresentar não apenas os resultados apontados acima, mas também abordar o perfil desse trabalhador rural, que se declarava como agricultor, a partir das informações declaradas. Assim sendo, a pesquisa já demonstrou que em um estado com forte ligação histórica com as atividades do campo o trabalhador rural ainda carecia de uma maior abrangência das leis criadas para garantir os direitos dos trabalhadores nos anos 1930. Contudo, uma pequena parcela já buscava por esses direitos através da carteira profissional. Em outras palavras, se é possível apontar que o trabalhador urbano e vinculado, sobretudo, às atividades fabris estava inserido no universo das leis trabalhistas, o trabalhador rural ainda necessitava atingir um patamar semelhante. Apesar desta consideração, as fichas dos trabalhadores que se declaravam como agricultores demonstram que o caminho já estava sendo percorrido nos anos 1930.
Referências bibliográficas:
GOMES, Angela de Castro. A invenção do trabalhismo. Rio de Janeiro: IUPERJ, 1988.
 LOPES, Aristeu Elisandro Machado; JAQUES, Biane Peverada. Os trabalhadores gráficos e os ofícios em extinção: tipógrafos e litógrafos no acervo da Delegacia Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul, 1933-1943. In: GILL, Lorena Almeida; SCHEER, Micaele. (Orgs.). À beira da extinção: memórias de trabalhadores cujos ofícios estão em vias de desaparecer. Pelotas: Editora da UFPel, 2015, p.15-28.

O ainda desconhecido acervo da Laneira S/A: possibilidades de pesquisa
Gabriela Brum Rosselli (Graduanda em História - UFPel)
Palavras-chave: Laneira – lã - fábrica
Resumo expandido:
A fábrica de lã foi construída no ano de 1945, na cidade de Porto Alegre e registrada com o nome de Laneira Brasileira Ltda., entretanto foi no dia 8 de dezembro do ano de 1948, que ocorreu a mudança de nome para Laneira Brasileira Sociedade Anônima Indústria e Comércio. Entre 1948 e 1949, a empresa iniciou seu processo de transferência para a cidade de Pelotas, muito em função da privilegiada localização geográfica da cidade nas rotas de comércio de lã no estado . A empresa foi pioneira na sua especialidade, a partir do tratamento da lã introduzido pelo seu fundador e presidente, o Sr. Moises Llobera Gutes. A fábrica localizava-se na Avenida Duque de Caxias nº144, no bairro Fragata. O local acabou se tornando um marco no setor de lã da região, porém em 2003 declarou falência e em abril do mesmo ano fechou suas portas. Em 2010 a Universidade Federal de Pelotas adquiriu o prédio onde se encontrava a Laneira. Dentro dele havia resquícios de um arquivo descartado e em péssimo estado. Foi na busca por reconstruir a história e a memória da instituição, que o Núcleo de Documentação Histórica (NDH) o inseriu aos demais acervos que o compunham. A constituição do acervo da Laneira visa salvaguardar a identidade da empresa e a memória dos trabalhadores, através de projetos de organização e higienização, fazendo com que todos os documentos fiquem à disposição de pesquisadores e demais interessados. O arquivo tem caráter permanente e possui a função de conservar, reunir e facilitar a consulta da documentação, tornando-a acessível para a sociedade. Os seus documentos ganham significado à medida que são utilizados como informação pela sociedade, servindo de subsídios para a interpretação histórica. Principalmente e acima de tudo, o arquivo histórico busca garantir a manutenção da memória e da identidade dos trabalhadores da Laneira. A metodologia empregada no projeto é constituída, primeiramente, da análise documental de fontes primárias, que são documentos do acervo. A unidade de análise desde projeto se refere a uma investigação documental no acervo físico do lanifício, a fim de validar possíveis organizações para áreas de pesquisa contidas nele. Segundo Le Goff (2003), o documento é um produto da sociedade que o produziu. Diante disso, sua preservação e disponibilização tornam-se primordial para a manutenção da memória coletiva. É através do contato direto com as fontes primárias, que se fez necessário, inicialmente, um projeto de separação do arquivo em décadas e logo o início da higienização, possibilitando a identificação de diversificadas fontes, como as administrativas, jurídicas e de gestão de pessoas. Podem-se encontrar registros de empregados contendo número de ordem, função, vencimento inicial, forma de pagamento, horário de trabalho, data de admissão, entre outros; fichas de empregados com exames médicos, atestados, contracheques, recibos de pagamento e abono de férias, contrato de trabalho, histórico do trabalhador; processos judiciais. A maioria dos documentos referentes a processos são de trabalhadores contra a fábrica. Há ainda projetos e plantas com desenhos, projetos de máquinas, escrituras de terrenos, jornais de 1960/1970 relacionados a direitos trabalhistas; livros de Contabilidade da década de 1950; folhas de pagamento contendo a relação do trabalhador e seu salário. O acervo também conta com outras fontes, porém em menor quantidade como documentos de admissão, demissão e controle dos funcionários, no que diz respeito à disciplina. Importante salientar que esses são, inicialmente, os documentos já vistos, entretanto o acervo está em processo de organização, por isso há muito que se descobrir, especialmente no campo das fontes e a ligação que se possa fazer entre este acervo e os outros existentes, especialmente no acervo do NDH, como a Justiça do Trabalho e a DRT. Dessa forma, criaram-se métodos para a organização e catalogação do acervo documental que vão ao encontro de regras arquivísticas, as quais são evidenciadas por autores como Bellotto (2006); Schellenberg (2005) e Paes (2008). O projeto visa, acima de tudo, disponibilizar o acervo para consulta, pois como afirma Lopes (2002, p.178) “os arquivos tornam-se objetos culturais quando são socialmente usados, caso contrário, é apenas um patrimônio físico que está ocupando espaço”. De acordo com Barroso (2002, p. 202), a função básica de um arquivo é recolher, conservar e servir. O objetivo primário na organização deste acervo é oportunizar o seu fácil acesso aos pesquisadores e à população em geral.
Outrora, mais precisamente no século XIX, considerava-se o documento histórico como fonte para a busca da verdade. Paul Veyne (1995, p.12) afirma: “Por essência, a história é o conhecimento mediante os documentos”. Para isso, o historiador “deveria valer-se de fontes marcadas pela objetividade, neutralidade, fidedignidade, credibilidade, além de suficientemente distanciadas de seu próprio tempo” (LUCA, 2008. p 112).
A partir da exploração documental feita, é possível se apropriar de informações contidas no mais novo fundo dos funcionários, o qual se divide por décadas e ano. Também está sendo construído um método de registro desses funcionários, por meio de uma listagem no Excel, constando o nome e a ocupação de cada trabalhador, a fim de facilitar as futuras pesquisas. Através de procedimentos metodológicos, é possível afirmar a existência de menores de idade naquele espaço; a ocorrência de acidentes de trabalho, a prática de serem instaurados inúmeros processos de trabalhadores contra a indústria, visando a garantia de direitos, entre outros aspectos. O objetivo do trabalho é a divulgação científica do acervo, a partir da caracterização da documentação como um campo aberto para novas pesquisas na área de humanas. Busca-se também motivar os acadêmicos a conhecer outros tipos de acervos, diferentes dos já constituídos e trabalhar com temas diversos, como a saúde, por exemplo. Através da análise dos documentos é possível traçar ainda estudos sobre a economia da cidade, os quais permitem abordar o desenvolvimento industrial existente e seu posterior declínio. A importância desse projeto parte do pressuposto de que esse é um acervo relativamente novo e ainda não se tem um número significativo de pesquisas sobre ele, ou seja, ainda é uma documentação desconhecida pela comunidade acadêmica e até mesmo por seus trabalhadores. É um arquivo amplo, o qual possibilita uma vasta produção, a partir de diferentes ramos do conhecimento como História, Direito, Sociologia, Economia, entre outros. Dessa forma, é extremamente importante o trabalho do NDH/UFPel, ao salvaguardar este tipo de documentação, protegendo os materiais existentes, ao mesmo tempo que possibilitando acesso a uma variada gama de informações.
Referências Bibliográficas:
Acervo do NDH. Disponível em: <http://www2.ufpel.edu.br/ich/ndh/> Acesso: 10 de Jul, 2015.
BELLOTTO, Heloísa. Arquivos permanentes: tratamento documental. Rio de Janeiro: FGV, 2004.
BARROSO, Vera Lucia Maciel. Arquivos e documentos textuais: antigos e novos desafios. Ciências e letras, Porto Alegre, n. 31, p. 197- 206, 2002.
GILL, L.A. LONER, B.A. O Núcleo de Documentação Histórica da UFPel e seus acervos sobre questões do trabalho. Revista Esboços, Florianópolis, v. 21, n. 31, p. 109-123, ago. 2014. Disponivél em: <”https://periodicos.ufsc.br/index.php/esbocos/article/view/2175-7976.2014v21n31p109/28464.’’> Acesso: 12 de Jul, 2015.
LEGOFF, Jacques . Documento/monumento. IN: LEGOFF, Jacques. História e memória. São Paulo: Ed. UNICAMP, 2003. p. 525 – 541
LOPES, Luis Carlos. O lugar dos arquivos na cultura brasileira. Ciências e Letras, Porto Alegre, n.31, jan/jun. 2002.
MELO, Chanaísa. Fragmentos da Memória de uma Fábrica na Coleção Fotográfica Laneira Brasileira Sociedade Anônima. Pelotas: UFPel, 2012, Dissertação de Mestrado no Programa de Pós-Graduação em Memória Social e Patrimônio Cultural. Disponível em: <” http://guaiaca.ufpel.edu.br/bitstream/123456789/1036/1/Chanaisa_Melo_Dissertacao.pdf”> Acesso: 10 de Jul, 2015.
POLLAK, Michael. Memória e Identidade Social. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 5, n. 10, 1992, p. 200-212.